Jardim de Alah- a vitória da destruição
A entrega de áreas (e serviços) públicas para a exploração pelo capital privado, direcionando lucros e financiamento (com dinheiro subsidiado) para empresários próximos dos políticos que entregam esse patrimônio, tem sido, infelizmente, comum no Brasil. O discurso é sempre o mesmo: o estado não é eficiente e os recursos são escassos (embora nunca faltem para bancar as mordomias dos marajás dos três poderes), então é preciso privatizar e concentrar os recursos nos serviços essenciais, que, contudo, permanecem precários.
Na verdade, o plano é privatizar até mesmo esses serviços. Atualmente, está em curso um plano para acabar com o serviço público, com a terceirização de TUDO que incumbe ao estado fornecer; refiro-me ao PL da reforma administrativa.
Adivinhar quem será beneficiado por essa negociata não é difícil. Sim! Serão eles, os empresários “parceiros”. Nessa jogada o estado entra com o dinheiro para os empresários e a população recebe os serviços terceirizados (bem podemos imaginar a qualidade).
Assim, esse movimento não é propriamente novo, mas vem se acentuando. Há projetos que querem privatizar a produção de água no RJ. A água fornecida para a população passaria a ter dono! Lembra os filmes da franquia “MAD MAX”, mas não é ficção.
No caso do Jardim de Alah, porém, há alguns pontos que tornam essa entrega do patrimônio público aos empresários amigos (os “parças” na gíria carioca), um ponto fora da curva pela desfaçatez com que se apresentou. Diga-se, desde logo, que o Poder Judiciário autorizou, pelo menos até agora, o negócio. O que não significa que este seja legal, quando se sabe a vocação e como operam nessas situações os tribunais, especialmente os estaduais, sujeitos a pressões políticas e extremamente sensíveis a lobbies.
O caso que culminou na destruição do Jardim de Alah, com a matança de árvores (130 árvores foram mortas) e dos animais que nelas habitavam, tem alguns ingredientes que o tornam emblemático.
Primeiramente, a área é tombada e tombada continua sendo. O mesmo município que a tombou, foi, sob o comando do prefeito Eduardo Paes, quem cedeu a área para a construção de um shopping center. A permissão para a transformação do Jardim em shopping em benefício doss já mencionados “parças” foi dada, portanto, por quem deveria zelar pelo tombamento, o que é, por si só, uma excrescência.
As desculpas apresentadas pelo prefeito, pela lamentável decisão judicial (objeto de recurso que teve o efeito suspensivo negado, permitindo a matança imediata das árvores e animais) e pelos beneficiários diretos para justificar a destruição da área merecem, também, ser denunciadas pelo cinismo ímpar que as caracterizam.
O local estaria abandonado, sem manutenção e ocupado por moradores de rua que ali usavam drogas e ameaçavam a segurança de moradores e transeuntes. Essa justificativa é vazia e escarnece da inteligência alheia. Sim, porque o abandono do local foi patrocinado pela municipalidade, a quem incumbia a responsabilidade de direcionar recursos para a manutenção da área. Mas, a prefeitura não cumpriu com isso e largou o Jardim de Alah a própria sorte.
Isso depois, de não tomar as providências que lhe cabiam em relação à concessionária do metrô que tinha a responsabilidade contratual de recuperar a degradação provocada pela obra (de inegável relevância pública, frise-se).
Ou seja, o abandono proposital pela municipalidade não pode ser aceito como desculpa para a entrega da área aos “parças” da prefeitura, para que estes ganhem dinheiro às custas da destruição do parque público. A desfaçatez não passa despercebida.
No aspecto da segurança, a afirmação de que os usuários de drogas seriam afastados, não resiste à realidade: passados alguns meses desde que a área foi cercada para a derrubada das árvores, os cracudos e ladrões apenas se mudaram para o entorno do antigo jardim e continuam se abastecendo do crack na boca de fumo da cruzada São Sebastião e assaltando no bairro. É um fato empiricamente comprovado que os viciados em crack nunca se afastam do lugar onde se abastecem, por conta da compulsão que caracteriza esse vício. Eles continuam ali, em especial às margens da Lagoa e também nas ruas próximas.
Assim, em resumo, as afirmações utilizadas para acabar com a área pública tombada, destruir o parque e transformá-lo em fonte de lucro para os ‘parças’ são mentirosas.
A luta para reverter esse atentado contra a cidade continua, apesar de tudo.